sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Ideias para Belo Horizonte: Largo da Liberdade

O CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil) é um marco cultural em Belo Horizonte, uma mudança de padrão em se tratando de "centros culturais". Ali se respira um ar diferente, em que cultura, povo e espaço público convivem e se completam. Não à toa está sempre lotado, ao contrário de museus do "circuito cultural" da Praça da Liberdade. Trata-se de uma ambiente que a cidade não tinha e que ultrapassa o padrão provinciano que predomina na capital. É um bom exemplo das diferenças entre os jeitos de governar do PSDB e do PT, entre a política neoliberal e a política petista, e principalmente entre o que as autoridades autoritárias nos dão e o que o povo quer. O CCBB tem vida, não é aquela coisa pasteurizada, fria e vazia de outros espaços em volta.

Tenho minhas ideias sobre a Praça da Liberdade. Não são nada extraordinárias, ao contrário, são o que qualquer um pode pensar, o que todo mundo vê, porém muito diferentes do que a Praça é. Penso nisso há mais de dez anos, bem antes do Aécio criar seu "circuito" como subproduto do centro administrativo, este sim o seu projeto, copiado de JK, uma obra bilionária, uma catástrofe urbanística retrógrada. Já que os prédios das secretarias ficariam vazios, por que não transformá-los num "circuito cultural"? Copiar JK com meio século de atraso e batizar tudo com o nome "Tancredo Neves" -- assim se pode resumir o plano de governo do Aécio.

Tem realmente muito tempo que eu penso nisso, porque quando Itamar era governador e falou em construir um túnel na Praça eu já pensava nisso há algum tempo. Elaborei mais a ideia quando caminhava diariamente na Praça. Na verdade ela ficava evidente dia após dia, era a própria praça que parecia me dizer que aquilo ali podia ser diferente, que tinha outra vocação e precisava ser transformado. Alguém soprou a ideia ao Aécio, porque é claro que não era só pra mim que ela se insinuava, e ele aproveitou-a, mas, com sua mediocridade característica, deturpou-a.

Na Praça, Aécio fez a parte óbvia e menos importante, diria mesmo que fez tudo errado. Prova do projeto oportunista e medíocre é que o Palácio não foi incluído nele. Compreende-se: a elite não quer abandonar seu posto privilegiado na Praça, mesmo que seja um castelo mal-assombrado, sem uso; ele foi mantido para "momentos solenes", como o lançamento de candidaturas que aconteceu este ano... Quando a gente entra no CCBB, no entanto, nota a diferença entre o que a Praça se tornou e o que o pode ser.

Caminhadas e espaços públicos

Quando eu caminhava na Praça, às seis horas da manhã, percebi que eu e todos os outros (inclusive um dos mais ricos empreiteiros de Minas) estávamos errados: a Praça não foi feita para caminhada, nós estávamos roubando o espaço dos transeuntes, das pessoas comuns, que sempre ocuparam aquele espaço público, de passagem ou para lazer: aposentados, crianças, estudantes, "povo". A caminhada na Praça foi improvisada pela falta de pistas adequadas e de espaços públicos em Belo Horizonte, que é um assunto que me ocupa desde sempre.

Quem mora no Rio de Janeiro, por exemplo, onde todo mineiro sempre quis morar e para onde milhões foram, vive diariamente a diferença entre uma cidade com praia e este monstrengo frio e violento que se tornou BH. A praia é um infinito espaço público e são os espaços públicos que dão vida à cidade.

Caminhar virou uma febre recomendada por médicos e especialistas, a atividade física mais fácil e de graça. É muito bacana ver o povo caminhando, porque é de fato o povo, gente de todas as idades e todas as classes -- empregadas domésticas caminham na Avenida Bandeirantes, na Praça da Liberdade e em vários locais "nobres" onde já caminhei.

A Praça virou o espaço de caminhada da cidade por excelência, mas não tem pista demarcada nem barras de alongamento, como outros locais. Foi e continua sendo improvisado. Quando eu passo por lá todos os dias, voltando do trabalho, enfrento, na "contramão" dezenas de pessoas que caminham ou correm na direção oposta à minha. Para piorar, a Praça é malissimamente iluminada.

Criar calçadões e integrar o Palácio  

Nem todos os mineiros podem viver no Rio e acho que aqueles que podem devem melhorar Belo Horizonte. A primeira ideia que me veio, quando comecei a caminhar na Praça, é que a Prefeitura tinha de fazer pistas de caminhadas. Para isso, deve fechar as ruas laterais. Aí a ideia começa a tomar forma: sem trânsito de veículos nas ruas laterais, muda-se também o piso, o local vira um calçadão e os prédios das secretarias se integram a ele. Alguns poderiam se transformar em centros culturais, abrigando teatros, cinemas, exposições, cafés. Será que dava pra montar um café em algum terraço? Não seria bacana ter um café, um restaurante no terraço, com vista da cidade?

Pronto, a Praça, além de lugar de lazer, teria pista de caminhada adequada e se tornaria um grande calçadão, com centros culturais ao redor. Não em todos os prédios, porque não é ruim ter movimento de trabalhadores, ao contrário. O melhor é misturar, ter movimento, espaços abertos, inclusive nos fins de semana e feriados, para que os lugares não se tornem desertos. Além disso, não é preciso ter tantos centros culturais, mesmo porque o maior e melhor prédio para abrigar um museu na Praça é o Palácio da Liberdade. Para isso, basta ligá-lo diretamente à Praça, transformando o asfalto também em calçadão, e retirar as grades que o cercam.

As grades em torno do Palácio foram colocadas pela ditadura em 1967. A informação está no folheto de visitação que o governo imprimiu (o Palácio fica aberto aos sábados e domingos). Nenhum governador eleito depois teve coragem de removê-las.

Imagino agora a Praça, incluindo o Palácio, tudo ligado por um calçadão, o Palácio transformado em museu, a Biblioteca Pública, as secretarias transformadas em centros culturais, como o do CCBB, em que diariamente, no começo da noite, um excelente grupo de atores trajados como no começo do século XX nos dá uma boa aula de história, nos convida para entrar, para entrar sempre, sem cerimônia, pois o local só tem valor se for ocupado pelo povo...

O Largo da Liberdade e as obras necessárias

O CCBB mostra a diferença entre a vocação da Praça e o que fez dela o governo Aécio. O CCBB de Belo Horizonte se diferencia dos museus do "circuito" porque não é o primeiro, ele aproveita uma experiência rica formada no Rio e em outras capitais, e que se caracteriza pela ideia de difusão da cultura com participação popular.

A vocação da Praça da Liberdade é de espaço público e para isso é preciso incorporar o Palácio e retirar suas grades, transformar as ruas em calçadões. Na verdade, o que importa é criar o "Largo da Liberdade" -- "circuito cultural" é um nome de propaganda, bem no espírito neoliberal, que aluga os espaços públicos. O "Largo", ao contrário, expressa a ocupação popular do espaço; a intervenção do deve-se dar para que a vocação da Praça se realize plenamente, retirando os empecilhos e executando obras necessárias.

Esta é a diferença entre uma administração cosmopolita e moderna e uma administração provinciana e colonial. A Praça como eu a imagino é o melhor espaço público belo-horizontino; tal como está é um pastiche modernoso neoliberal.

Quais são as obras necessárias? São obras que mesmo dispendiosas seriam certamente aceitas e aplaudidas pela população, ao contrário de viadutos que caem, "Moves" feitos e refeitos, tão ou mais caros e desnecessários, mas que prefeito e governadores neoliberais se empenham em construir, para aumentar a fortuna das empreiteiras e irrigar suas campanhas eleitorais.

Túneis, como quis Itamar, ligando as avenidas Bias Fortes, Brasil e Cristóvão Colombo. O trânsito ficaria ainda melhor. Acho que se deve manter o trânsito na Rua Gonçalves Dias, porque é uma oportunidade de se desfilar de carro na frente da Praça e admirá-la, especialmente no Natal, quando o lugar ganha iluminação especial. Mais do que via de trânsito diário, essa rua seria um ponto turístico, desses que as cidades precisam.

Retirar grades e pisar na grama

No mais, o que é preciso fazer são os calçadões, as pistas de caminhada, retirar as grades do Palácio e transformá-lo no melhor museu da cidade. De que tipo, deve-se ouvir gente que pensa -- bem -- sobre o assunto, como os que administram o CCBB e outros (Belo Horizonte tem gente mais que qualificada: nas gestões Patrus, Célio e Pimentel, o Museu Histórico Abílio Barreto foi um grande exemplo de museu que acolhe a população), e não neoliberais privatizantes que só pensam em "eventos".

Aliás, não há nada mais inadequado para a Praça do que os "eventos" patrocinados por empresas que a ocupam nos fins de semana, cercando todos os gramados com grades e gerando transtornos para seus usuários habituais.

O que é preciso não é cercar os espaços públicos, mas retirar as grades, convidar as pessoas a pisar na grama.

Esta é outra diferença entre o modelo neoliberal de espaço público e o que o povo quer: o povo quer pisar na grama, como pisam os moradores das cidades da Europa e dos EUA, dos quais nossos governantes neoliberais colonizados copiam tudo, mas não isso -- aqui, afastam o povo da grama e dos espaços públicos com grades, avisos ameaçadores, câmaras de segurança e policiais.

E iluminar o Largo, pois a Praça é pessimamente iluminada: postes históricos foram arrancados e muitos estão com lâmpada queimada. As árvores encobrem as luminárias altas, um erro boçal comum e antigo na iluminação belo-horizontina, que ainda provoca desperdício de energia (quando em caminhava na Praça, de manhã cedo, cansei de ver lâmpadas acesas durante horas, depois que o dia clareava). Obviamente, os postes precisam ser baixos e as lâmpadas devem ficar abaixo das folhagens.

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